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Os 5 fatores que possibilitaram a eleição de Davi Alcolumbre

RENAN CALHEIROS ERA o franco favorito para vencer a disputa à presidência do Senado nesta sexta (1º). O conflito foi tão atípico que nem mesmo se deu no dia da posse: foi adiado para o dia seguinte, tal como uma disputa de futebol argentino. Durante a madrugada, como não poderia deixar de ser, rolou ainda uma decisão do STF, onde Renan exerce enorme influência.

Renan já presidiu o Senado quatro vezes (2005-2007; 2007 de novo, quando renunciou à presidência, assumida por Tião Viana; 2013-2015 e 2015-2017). Tudo indicava que seria penta. Mas os seguintes fatores interferiram para a eleição de Davi Alcolumbre:

1. Eleição de 2018

A eleição do ano passado deu ao Senado a maior renovação de sua história. Das 54 vagas disputadas, 46 foram ocupadas na sexta-feira por novos nomes — renovação de mais de 85%. Alguns parlamentares experientes, como Gleisi Hoffman e Aécio Neves, não concorreram, preferindo se rebaixar a deputados federais. Outros tantos nomes tradicionais foram demitidos nas urnas: Eunício Oliveira, Edison Lobão, Lindbergh Farias, Garibaldi Alves Filho, Valdir Raupp, Roberto Requião, Vanessa Grazziotin, etc.

Renan teve de lidar subitamente com muito sangue fresco. Incluindo cinco senadores da Rede, partido de Randolfe (e não de Marina), quatro do PSL (um deles, OK, Flávio Bolsonaro, que tudo indica ter votado em Renan no 1º escrutínio, que foi anulado) e toda uma leva de gente empurrada pelo bolsonarismo, a maior força eleitoral de 2018. Os novatos não têm muitos compromissos com Renan.

2. Redes sociais

Como a eleição de 2018 mostrou com vitórias impressionantes de candidatos com pouco tempo de TV, o eleitor está mais conectado do que nunca, e os políticos também. A pressão da militância chega nos celulares dos políticos (principalmente no do Kajuru) e seus assessores. O ‘Fora Renan’ não tomou as ruas, mas estava forte nas notificações. Naturalmente, muitos dos novos senadores também chegarem ao carpete azul por meio do Zap.

3. Onyx Lorenzoni

O ministro-chefe da Casa Civil já foi ridicularizado em plenário pelo próprio Renan por causa de seu sobrenome: “Onyx Lorenzetti”. O jogo virou. Onyx teve nos últimos anos melhor visão do cenário político que a grande maioria: apostou no impeachment ainda em 2015 e foi um dos primeiros a embarcar na onda Bolsonaro, ao contrário das “raposas” do Centrão, que foram de Alckmin. Desafiou ainda outra regra não-escrita de Brasília de que um partido não deve comandar as duas casas do Congresso, insistindo na eleição de Davi Alcolumbre no Senado mesmo sendo certa a vitória de Rodrigo Maia na Câmara.

4. Várzea

O Senado é a casa tradicional das piores “cenas parlamentáveis”; como lembramos aqui, já rolou até assassinato, e o senador morto nem era o alvo original.

Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) declara voto em Alcolumbre, após primeira votação ser cancelada.
Foto: Pedro França/Agência Senado

A confusão dos 82 votos abriu caminho para um gesto até então não-antecipado. Flávio Bolsonaro disse que não ia abrir o voto. De fato, não abriu. Mas como houve uma segunda votação, mudou de ideia e anunciou voto em Alcolumbre. Como os senadores do RJ são a segunda bancada a votar, era um sinal de que o jogo estava perdido para Renan, que anunciou sua retirada da disputa instantes depois.

5. Davi Alcolumbre

Davi Alcolumbre fazia campanha já há algum tempo. Em 18 de janeiro, a revista Crusoé publicou que ele já circulava pelos Estados e telefonava a novos e antigos senadores pedindo voto, “se apresentando como o candidato com mais acesso ao novo governo, em razão de sua proximidade com o ministro da Casa Civil”.

Alcolumbre, duplamente investigado no STF por supostas fraudes cometidas nas eleições de 2014, percebeu que no Senado ninguém dá a menor importância para regras e qualquer entendimento muda como o vento. O que vale é a realpolitik.

Sua presidência da sessão preparatória era duplamente errada: por ele ser candidato e porque o regimento obriga o voto secreto. Mas obriga mesmo? Texto não vale nada, seja no Senado ou principalmente no STF. Alcolumbre mostrou força (elogiada ao menos duas vezes pelo catarinense Jorginho Mello). E, como Frank Underwood, bateu na mesa.

Toc-toc, Renan.

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Publicado por
Cedê Silva