A imprensa é esquerdista por uma questão de lógica

Não é natural, contudo, que a esquerda veja a imprensa amiga como uma inimiga a ser regulada. Foto: Engin Akyurt / Pixabay

Não é natural, contudo, que a esquerda veja a aliada como inimiga

APESAR DE TODA A DEMONIZAÇÃO enfrentada junto à opinião pública, o sistema – politicamente falando – pode ser compreendido como o conjunto de decisões históricas da sociedade. Que podem, claro, ser questionadas, uma vez que estão longe da perfeição, ou não serão eternamente perfeitas. Por este ponto de vista, a esquerda nasce como a força que cresce com tais questões. E a direita, como a que reage ao se sentir prejudicada pelas dúvidas – dando origem ao termo “reacionário”, ou aquele que se opõe por padrão.

Millôr Fernandes defendia que imprensa era oposição e essa definição tem servido de base ao debate político no Brasil. Mas, quando o Estado acerta, cabe à imprensa pregar o erro? Talvez por isso faça mais sentido cobrar da mídia que simplesmente tente ser justa, cumprindo com o papel de informar a opinião pública daquilo que de fato é relevante, doa aos governistas, doa aos opositores.

Mas é verdade que a opinião pública espera do Estado uma boa conduta. E que seguir a linha não deveria ser nada além do que mera obrigação do gestor. Logo, é mais fácil gerar notícia dos desvios, do inesperado, do erro de quem é pago com impostos. O que faz com que Millôr mais acerte do que erre, pois o editor precisa trabalhar como um fiscal impiedoso.

Se a imprensa vive de policiar os erros do sistema, e a esquerda nasce para propor ajustes a este sistema, é natural que, em dado momento, se aliem. Ou pior: se confundam. Afinal, um jornalismo que vive de encarnar o defensor facilmente se converte em “chapa branca”, ou aquele que relega o interesse do leitor a segundo ou terceiro plano.

Sem espaço na redação, não resta muito à direita senão o trabalho independente, a coluna de opinião, o blog, a mala-direta, o influenciador que se divide em mídias digitais, cursos e congressos. Soa uma luta desigual e é. Mas, ao advogar para o modus operandi, há de ao menos conseguir apoio do operador para manter-se em pé – se mantiver uma conduta adequada, o que tem sido raro no “conservadorismo do terceiro milênio”.

Contudo, não soam naturais os reclames esquerdistas contra o jornalismo. Pois este vive de adular esse, como uma vítima apaixonada pelo algoz. E de quem se cobra a lealdade mais canina sob pena de ter a própria liberdade extinta – ou “regulada”, para ficar no eufemismo explorado pela militância.

Não que do outro lado a situação seja muito melhor. Mas, em comparação com os coletivos esquerdistas, os “lobos solitários” da direita são mais reféns da liberdade de expressão. E por isso percebem melhor o seu valor, defendendo-o com frequência maior.

Se esta relação não parece justa, ao menos parece lógica. E qualquer esforço para transformar o vício em virtude precisa, antes, compreender que a parceria entre esquerda e imprensa é fruto da decisão de organismos livres. E que talvez o melhor caminho não esteja no ataque à imprensa como tem sido hábito em grupos de ativistas, mas na defesa do trabalho do influenciador independente, pois este é nitidamente o lado mais frágil desta guerra.

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