O EMBAIXADOR JOÃO GENÉSIO DE ALMEIDA FILHO, representante alterno do Brasil na ONU em Nova York, ficou em cima do muro em reunião nesta sexta (11) sobre as alegações da Rússia a respeito de armas biológicas na Ucrânia, desmentidas veementemente por Ucrânia, Estados Unidos e outros países.
A delegação da Rússia pediu a reunião para chamar a atenção sobre o que alega ser um programa de armas biológicas na Ucrânia.
“Infelizmente, temos razões para acreditar que estas esperanças [sobre eliminar armas biológicas] não foram plenamente atendidas”, disse o embaixador da Rússia, Vasily Nebenzya. “Pedimos a reunião hoje porque a Rússia, ao conduzir operação militar especial na Ucrânia, descobriu um fato verdadeiramente chocante: uma limpeza emergencial pelo regime de Kiev dos rastros de um programa biológico militar que está sendo implementado por Kiev com apoio do ministério (sic) da Defesa dos Estados Unidos. Nosso ministério da Defesa, da Rússia, tem agora documentos que confirmam que no território da Ucrânia havia uma rede consistindo de pelo menos 30 laboratórios biológicos nos quais experimentos biológicos muito perigosos eram conduzidos. Com o objetivo de fortalecer as qualidades patogênicas da peste, Anthrax, tularemia, cólera e outras doenças letais por meio de biologia sintética”.
O embaixador da Albânia, Ferit Hoxha, rebateu imediatamente: “As alegações da Rússia são, em nossa opinião, parte da guerra de informação. Falsas, sem substância. Parte da típica propaganda e desinformação com origem na Rússia. Teorias da conspiração que não valem nosso tempo. O Conselho não deveria ser servido de fantasias”.
A embaixadora dos Estados Unidos, Linda Thomas-Greenfield, também: “A Rússia pediu a reunião de hoje do Conselho de Segurança com o único propósito de mentir e disseminar desinformação, e é exatamente o que ouviram do RP da Rússia nesta manhã (…) A Rússia está tentando usar o Conselho de Segurança para legitimar desinformação e enganar pessoas para justificar a guerra de escolha do presidente Putin contra o povo ucraniano. E a China também tem disseminado desinformação em apoio às alegações disparatadas da Rússia (…) Eis os fatos. A Ucrânia tem e opera sua própria infraestrutura de laboratórios de saúde pública. Estas instalações permitem detectar e diagnosticar doenças como a Covid-19, o que nos beneficia a todos. Os EUA ajudaram a Ucrânia a fazer isso com segurança”.
Antes de os representantes dos países falarem, a alta representante para Assuntos de Desarmamento da ONU, Izumi Nakamitsu, disse ao Conselho: “Estou ciente de relatos na mídia sobre alegações de programas de armas biológicas [na Ucrânia]. A ONU não está ciente de nenhum programa de armas biológicas”.
Nesta quinta (10), a Reuters revelou que a OMS aconselhou a Ucrânia a destruir patógenos perigosos em laboratórios para evitar “potenciais vazamentos” que poderiam adoecer a população.
A OMS admitiu essa recomendação em nota enviada à Reuters – não se trata de informação “em off”.
Os laboratórios, acrescentou a Reuters, receberam apoio dos Estados Unidos, da União Europeia e da própria OMS.
Não há nenhuma informação na reportagem da Reuters sobre armas biológicas ou pesquisas de ganho de função, aquelas feitas para tornar patógenos mais fortes e/ou mais contagiosos.
Robert Pope, diretor do Programa Cooperativo de Redução de Ameaças do Pentágono, deu entrevista ao Boletim de Cientistas Atômicos publicada no dia 25, um dia depois da invasão.
“Não há lugar [na Ucrânia] que ainda tenha qualquer tipo de infraestrutura para pesquisar ou produzir armas biológicas”, disse Pope ao Boletim.
“Cientistas sendo cientistas, não me surpreenderia se algumas dessas coleções de cepas em alguns desses laboratórios ainda tivessem cepas de patógenos que remontam às origens [soviéticas] desse programa”, acrescentou Pope.
Há vários anos a Rússia de Putin acusa os Estados Unidos e outros países de produzir armas biológicas.
A delegação do Brasil não quis se comprometer.
“O Brasil acredita que quaisquer acusações sobre violações das provisões básicas da BWC [Convenção de Armas Biológicas] são extremamente sérias e portanto devem ser exaustivamente substanciadas por evidências sólidas (…) Infelizmente tais mecanismos de investigação não são fortes o bastante no momento”, disse o embaixador Almeida Filho.
As alegações da Rússia sobre supostas armas biológicas na Ucrânia estão sendo reproduzidas a rodo nas redes por bolsonaristas e trumpistas.
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