Enquanto estas palavras são escritas, o Twitter de Jair Bolsonaro, canal que vem sendo tratado como oficial pelo presidente da República, segue um total de 263 contas. No seleto grupo, há alguns selos de verificação, em especial, nos órgãos ligados à administração pública, como o TSE, o MPF e o Ministério da Defesa. Mas uma breve busca revela no grupo a recorrência de uma palavra pouco utilizada nos últimos anos: “sátira”.
Já próximo à eleição de 2018, espalhou-se junto aos MAVs da direita nacional que perfis “falsos” não seriam derrubados caso trouxessem, ainda que de forma discreta, o alerta de que trabalhavam uma “‘sátira” do alvo da graça. Contudo, percebe-se na prática algo além do exercício do humor. Porque os satirizados são sempre veículos ou jornalistas que trabalharam pautas que desagradaram o bolsonarismo.
Despontam como vítimas do estelionato os nomes de Reinaldo Azevedo, Ricardo Noblat e Mônica Bergamo (duas vezes), além de Folha de S.Paulo (duas vezes), Brasil 247 e Estadão. Como a rede social registra os perfis por ordem de assinatura, do mais novo ao mais antigo, percebe-se que, em dado momento, de oito contas assinadas pelo presidente da República, seis delas eram falsas, a metade delas criada em dezembro de 2018.
A armadilha não é complicada de se entender: sempre que um influenciador se deixa confundir pela paródia, passa a ser ridicularizado por toda uma leva de milicianos digitais. Por vezes, o próprio presidente da República permite-se compartilhar o escracho.
Ciro Gomes foi uma das primeiras vítimas. O presidenciável derrotado ainda no primeiro turno reverberou em plena GloboNews uma das false flags lançadas contra Paulo Guedes.
Nada disso soa orgânico. No melhor cenário possível, denota a conivência de um líder político com ações – coordenadas ou não – que atentam contra a credibilidade de um setor tão fundamental para o exercício da democracia. No pior, salta uma agenda contrária à liberdade de imprensa. Que só piora ao se constatar que nasce de um grupo que vivia a levantar faixas a favor de uma imprensa livre.
Bolsonaro já revelou em entrevista que não manipula as redes sociais que mantém, terceirizando-a a um amigo militar. Também elogiou as habilidades digitais de Carlos Bolsonaro, apelidado pelo próprio pai de “pitbull”. Coincidência ou não, o vereador carioca é o perfil que o presidente segue há mais tempo.