Quando – ou se – chegar ao final do mandato, Jair Bolsonaro terá nomeado ao menos dois ministros para o Supremo Tribunal Federal. Mas o PSL já começou a coleta de assinaturas para revogar a PEC da Bengala, o que dobraria o número, e o ampliaria para sete numa reeleição. Contudo, o céu é o limite, uma vez que podem ocorrer eventuais óbitos, aposentadorias precoces e – não escondem o desejo – processos de impeachment.
Em outras palavras, se depender da vontade do segundo maior partido do Congresso Nacional, a Suprema Corte brasileira, que atualmente comporta o legado de seis presidentes, chegará a 2026 quase que totalmente aparelhada pelo Governo Bolsonaro. Todavia, esse está longe de ser o único projeto autoritário do bolsonarismo. Pois há toda uma agenda antidemocrática engatinhando na base governista.
A mais explícita tem por objetivo a desmoralização da imprensa mais crítica ao Governo Federal, com milicianos digitais assassinando a reputação de jornalistas, e perfis falsos desinformando a respeito do trabalho dos principais jornais – por vezes, com a conivência do presidente da República.
Opositores já estão sendo espionados, com a ABIN sacada pelo Gabinete de Segurança Institucional para bisbilhotar a organização de evento da Igreja Católica. O general Heleno não escondeu o desejo de “neutralizar” debates entendidos pela gestão como de temas esquerdistas – aquecimento global, desmatamento, povos indígenas e quilombolas –, o que se assemelha bastante a uma censura estatal.
Censura essa que já deu as caras quando a EBC nada noticiou a respeito do autoexílio de Jean Wyllys, quando a TV Câmara não transmitiu uma reunião com Sérgio Moro, quando vídeos entendidos como esquerdistas sumiram de site ligado ao MEC, quando o próprio presidente prometeu manipular a verba de publicidade para quebrar veículos não governistas, ou quando o trabalho da imprensa foi cerceado já na cerimônia de posse.
Mas nada supera o “excludente de ilicitude”, principal promessa da campanha vitoriosa, que pode ser ampliado pelo Pacote Moro, elevando a letalidade de uma polícia já inaceitavelmente sangüinária e, ao contrário do que imagina a premissa, porcamente punida. O fato de a agenda vir de um clã tão próximo de milicianos amplia ainda mais a preocupação.
O que impede projeto tão grotesco de se converter em desastre? A própria incompetência dos artífices. Mas essa é uma garantia para lá de frágil. Pois, a cada nascer do sol, a experiência faz deles menos incompetentes. Se nada for feito, há de chegar o dia em que aprenderão o caminho das pedras.
As trapalhadas do Governo Bolsonaro dão um tom tragicômico ao noticiário. Mas foi de trapalhada em trapalhada que esse membro do baixo clero chegou à Presidência da República. O preço de seu fracasso é a eterna vigilância de uma oposição responsável. Os brasileiros que ainda entendem o valor de uma democracia podem até rir dos tropeços, mas não podem descansar.