TUDO PARECIA INDICAR uma terça livre de preocupações. O Presidente começou o dia acompanhando a ministra Damares Alves e a primeira-dama Michelle ao cinema para uma sessão exclusiva do filme Superação – o milagre da fé. À tarde, empresários entregariam a Bolsonaro uma carta manifestando apoio à reforma da Previdência.
Eis que pouco antes do almoço, por volta do momento em que o filme estava acabando, chega a notícia: o ministro Paulo Guedes cancelara seu comparecimento à CCJ da Câmara, onde iria defender a reforma. Em seu lugar, o governo ofereceu Rogério Marinho, secretário especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia. Os deputados preferiram não ouvi-lo, e ficou combinado novo convite para que Guedes compareça na próxima quarta (3).
Mas aí a coisa escalou. À noite, no espaço de uma hora, o plenário da Câmara votou em dois turnos (!) uma outra PEC, a que amplia o orçamento impositivo. A medida é totalmente oposta ao que Guedes defende, que é maior autonomia do Executivo para remanejar despesas. Ela entrega mais poder aos deputados, a turma que os olavistas chamam “establishment”. Proposta originalmente em 2015 pelo deputado federal Hélio Leite (DEM-PA), repousou em uma gaveta da Câmara por mais de três anos sem qualquer movimentação. Não estava na ordem do dia desta terça e só apareceu na sessão extraordinária marcada para as 20h (em Brasília quase todas as coisas importantes acontecem à noite).
O que muda? Atualmente, já são impositivas as emendas individuais dos parlamentares, sendo que metade do valor deve ser aplicado em saúde. Elas estão sujeito ao teto de gastos aprovado em 2016. A nova PEC, se passar no Senado, determina a obrigatoriedade das emendas de bancadas estaduais e do Distrito Federal. É importante lembrar: o Presidente não pode vetar uma PEC.
Apesar de a votação não ter sido prevista ou anunciada, não fazer parte dos “talkey points”, e contrariar a agenda econômica e também a doutrina olavista do governo, alguns líderes prontamente quiseram cantar vitória. Para disfarçar a derrota, Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) votou a favor da PEC, e Carla Zambelli (PSL-SP) gravou vídeo contando que o Presidente orientou voto nesse sentido. O discurso de Zambelli pode até confirmar a direção dada pelo Planalto, mas não explica por que a proposta real, o objeto da questão, ajudaria o governo e sua administração.
A líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann (PSL-SP), votou contra a PEC, no 2º turno. Ela e mais cinco deputados. O placar foi 453 x 6.
Uma tremenda vitória.
Relembre: Votação da primeira derrota de Jair Bolsonaro reprisa a do impeachment de Dilma Rousseff