O polêmico Guia Politicamente Incorreto do Governo Bolsonaro

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Livro a ser lançado no próximo século defende a tese de que Bolsonaro seria, na verdade, esquerdista

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O ano é 2119. No centenário da posse de Jair Bolsonaro, a editora Distopia lança o Guia Politicamente Incorreto do Governo Bolsonaro. Nele, o autor Enzo Gabriel Neto trabalha a tese segundo a qual Bolsonaro teria sido um dos maiores esquerdistas a comandar o Brasil.

Já na introdução, Enzo destaca que o ex-presidente pertencia ao PSL, o Partido Social Liberal. Se “social” era uma clara referência a socialismo, “liberal” remetia à forma como os Estados Unidos, tão adorados pelo ex-presidente, chamavam a esquerda militante do Partido Democrata. “Jair chegava a bater continência para autoridades americanas que visitavam o Brasil”, enfatiza o autor.

Na sequência, o livro recorda como uma figura tão polêmica entrou para a política. No caso, partindo de manchetes ainda dos nos anos 1980, quando teria tramado atentados terroristas como os que se tornaram comuns na ditadura militar. Todavia, o alvo não era a população, mas as mesmas Forças Armadas das quais fazia parte. “Só guerrilheiros esquerdistas praticavam atentados contra o exército”, argumenta Enzo. “Mas não seria a primeira vez que o eleitor escolheria um terrorista para o cargo. Antes de Bolsonaro, o Brasil chegou a eleger Dilma Rousseff”.

Na década seguinte, Bolsonaro voltaria ao noticiário por defender o fuzilamento de Fernando Henrique Cardoso, presidente constantemente xingado de “neoliberal da direita” pelo Partido dos Trabalhadores – que, mesmo na oposição, era a maior sigla da esquerda nacional.

O amor de Bolsonaro pelo esquerdismo era tão forte que, ainda como deputado federal, não escondeu o entusiasmo com a chegada de Hugo Chávez ao comando da Venezuela. Mais ainda: não só assumiria publicamente que via em Lula um exemplo de honestidade, como foi além e, com um voto no segundo turno, ajudou a fazer do petista o primeiro presidente da República do século XXI.

Enzo separa ainda alguns capítulos para mostrar que Bolsonaro, membro do PP por 11 anos, integrava a base das gestões do PT, chegando a votar com o partido em várias pautas. E que, graças ao quociente eleitoral, permitia que outros dois deputados votassem em acordo com os interesses do governo. O partido que integrava, inclusive e em decorrência das investigações tocadas pela Lava Jato, era a agremiação com o maior número de parlamentares investigados no STF.

Já próximo à eleição que o consagraria, Bolsonaro ganhou destaque na mídia ao apoiar uma greve dos caminhoneiros. “Que tipo de conservador apoiaria uma greve que causaria um prejuízo bilionário ao país num momento em que a economia tentava escapar da maior recessão da história?”, pergunta Enzo.

Quando assumiu a Presidência da República, a direita em peso exigiu uma reforma previdenciária que salvasse as contas públicas de um desastre anunciado. Mesmo assim, o presidente Bolsonaro contrariou as expectativas, propondo-se apenas a empurrar com a barriga o problema ao sucessor. Sem oferecer respostas, o autor joga a questão com ares de retórica: “Será que Bolsonaro queria evitar um desgaste com suas bases esquerdistas?

O livro segue se debruçando sobre a gestão em si. Mas essa resenha já deu mais spoilers do que sugerem os melhores manuais de redação. Contudo, cabe adiantar que Enzo Gabriel Neto conclui a obra de forma bastante convincente. As centenas de referências bibliográficas provam ao leitor que tudo foi, sim, narrado em cima de fatos bem documentados, seguindo um rigoroso compromisso com a verdade. E que o cidadão brasileiro foi ludibriado por toda uma vida escolar.

Nota do editor

Este exercício lúdico não é uma defesa irônica de que Jair Bolsonaro seria um esquerdista enrustido. Mas um de quão fácil é para os “enzos” pinçarem apenas fatos que servem à narrativa encampada, podendo contar às futuras gerações o que bem entender. Até mesmo que o presidente mais conservador do Brasil seria, na verdade, um esquerdista pintado como reacionário nas aulas de história.

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